Para esquentar: maestro desafiado a conversar com público aberto

Em entrevista a William Campos Viegas, estagiário da Pró-reitoria de extensão da UFMG (William nem precisou se formar para mandar muito bem nas perguntas), o maestro Roberto Tibiriçá confessa: "estou ansioso e nervoso porque não sei quais perguntas serão feitas, mas quem sai na chuva é para se molhar." E diz sentir um carinho grande por Belo Horizonte, onde já morou quando dirigiu a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais.


Proex/UFMG: Você já participou de bate-papo com um público não restrito à música? E qual a expectativa em participar do projeto Retratos de Artista: Molduras do Pensamento?
Roberto Tibiriçá: Não. É a primeira vez que participo de um debate aberto a um público não ligado, especificamente, ao universo da música. Confesso que estou ansioso e nervoso porque não sei quais perguntas serão feitas, mas quem sai na chuva é para se molhar. Só espero ter jogo de cintura para dar conta. O projeto é fantástico por não ser restrito a um determinado público. As pessoas têm uma imagem muito séria dos maestros, como se fôssemos intocáveis. Somos pessoas comuns. A ideia do evento foi genial, pois, além de nos aproximar, desmistificará essa imagem construída.

Proex/UFMG: Em seu trabalho como se dá a mistura entre erudito e popular?
Roberto Tibiriçá: Se reportarmos à época de Vinícius de Moraes, Tom Jobim, Dolores Duran, Noel Rosa perceberemos que foi um momento rico da Música Popular Brasileira. Hoje temos aí Caetano Veloso, Gilberto Gil, Nana Caymmi, entre outros grandes artistas, cujas composições têm uma melodia bem reunida, uma harmonia bem feita. O nosso grande papel atualmente é a formação de uma nova plateia. Há alguns anos, tanto nos meus concertos quanto nos de outros amigos, víamos apenas pessoas da terceira idade. Hoje a juventude tem comparecido em massa. As pessoas estão buscando outros caminhos. Então, por que não criar concertos populares e incluir numa apresentação, por exemplo, da Sinfonia de Beethoven, a artistas de outros estilos musicais? Essa é a mistura que proponho.

Proex/UFMG: Você já fez arranjos próprios com canções marcantes da MPB e já trabalhou com músicos consagrados nesse estilo. Isso fez com que você criasse o projeto Sinfônica Pop. Como surgiu essa ideia?
Roberto Tibiriçá: Surgiu no Rio de Janeiro quando eu estava à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira com objetivo de atrair novas plateias, a juventude. É como dar um remedinho amargo para uma criança. Sempre temos que oferecer um doce antes. Assim, antes da orquestra executar um trecho da Sinfonia de Beethoven, havia uma apresentação da Nana Caymmi, por exemplo. É legal trazer um repertório que a plateia reconheça.

Proex/UFMG: Essa união quebra um possível tabu existente tanto com a música erudita quanto com a popular?
Roberto Tibiriçá: Quebra. Também contribui para a formação de outras plateias e desperta o interesse das pessoas para a música clássica. Um dos primeiros a fazer essa junção foi o grupo Pink Floyd quando lançou um LP com a Sinfônica de Londres. A música quando é boa, ela é válida independente do estilo. Ouço de tudo, dos clássicos à Madonna. Tem hora pra tudo.

Proex/UFMG: Atualmente, você participa, como convidado, de vários concertos, entre eles, os promovidos pela  Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). Qual o retorno do público?
Roberto Tibiriçá: Falo que sou como um ministro sem pasta ou um maestro sem orquestra. Estamos num ano eleitoral, então prefiro ser convidado já que muitas orquestras no país são vinculadas ao governo. Estou esperando o desenrolar desse cenário. É raro vermos um governo que é sensível a arte, à música e que aposte em orquestras. Em São Paulo, criou-se a OSESP, a maior da América Latina. Mas infelizmente são poucos sensíveis a arte em geral e é uma incoerência enorme, pois quando um líder político vem ao país, eles sempre promovem um apresentação artística. Um país sem cultura não é nada. Como convidado eu sigo as regras, não escolho o que vou fazer. Quando sou diretor, tento alcançar o maior número de pessoas. O Palácio das Artes lotou quando juntamos João Bosco e a Orquestra. Esses artistas têm uma mídia forte em cima deles. Nesses casos, eu recebo muitas mensagens, agradecimentos e pessoas surpresas com a mistura que estabeleço.

Proex/UFMG: Além da MPB, você mistura outros ritmos?
Roberto Tibiriçá: Sim. Em Minas Gerais fizemos uma apresentação com a Zizi Possi, uma das artistas mais ecléticas e eruditas que conheço. Foi um espetáculo. Ela cantou quatro obras clássicas, seguido de músicas italianas e finalizou com samba. É um congraçamento da arte. Mas infelizmente há colegas caretas que não aceitam essa mistura. Tem momento para tudo e tem hora que dá para juntar o erudito e o popular.

Proex/UFMG: Quando foi a última vez que esteve em BH?
Roberto Tibiriçá: No fim do ano passado quando a Orquestra Sinfônica e o Coral Lírico executaram a 9ª Sinfonia de Beethoven. Foi um sucesso as duas apresentações tanto que tivemos que fazer uma extra. Beethoven tem um impacto, mas esse sucesso de público é resultado de um trabalho coletivo bem realizado É muito gostoso voltar a Belo Horizonte, eu adoro essa cidade. Além disso, os mineiros são muito queridos e sempre recebem todos muito bem. Já fui condecorado com a medalha Juscelino Kubitschek só falta agora o título de cidadão honorário, mas eu já me considero um “mineirin”.

Proex/UFMG: Entre 2010 e 2013 você foi regente titular da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais. Qual foi sua maior contribuição?
Roberto Tibiriçá: Fui chamado para ajudar a reestruturar a Orquestra e o Coral Lírico. Foi um trabalho em conjunto com a Fundação Clóvis Salgado, a Secretaria de Estado de Cultura, os músicos, entre outros. Conseguimos, por exemplo, sensibilizar o Governo de Minas da importância de autorizar um concurso. Creio que foi um avanço.

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